Debruço-me da varanda. Contemplo o
céu carregado e a chuva que corre sobre os telhados, e desliza, murmurante, nos
vidros das janelas.
Mais uma desculpa para permanecer hoje
no esconderijo da casa.
Espero que a chuva se esgote, que o céu
aclare, para acabar com esta quietude, agora justificada pela água breve que
rasga os céus e condiciona a liberdade ao parapeito de ferro da varanda.
Estes dias cansam-me, porque sei que,
inevitavelmente, os próximos serão iguais, e nada cansa mais do que viver
dentro de uma roda, que incessantemente circula na mesma direcção.
O aguaceiro parece ter abrandado.
Dos telhados ainda escorrem as últimas
gotas e um gato perdido, com água colada no pêlo, salta dum esquecido
recanto, e corre para longe. Foge apenas porque o seu instinto a isso o
obriga.
Olho o relógio. Parou às sete horas de
um infindável dia, guardado nas dobras da memória, e nunca mais retomou a sua
função de marcar o tempo.
Recusa-se a registar a solidão, o vazio,
o silêncio. o absurdo e incompreensível tempo, onde a tarefa de reencontrar o
sentido da vida, carregando o fardo dos dias iguais, me recorda o cruel
castigo imposto ao rebelde Sísifo, eternamente condenado a recomeçar...
A chuva parou.
O relógio marca as sete horas, da
manhã ou da tarde, tanto faz...
13 de Maio de 2020
MAlice Silva
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