Oitava semana. Sinto-me a deambular pela casa, não porque me
sinta deprimido, estou lúcido, bem lúcido, mas zangado, é exatamente isso. O
meu espaço é outro, gosto de gostar das pessoas, gosto da proximidade, gosto da
conversa, do olhar e, quando calha, até de uma disputa, de um confronto de
ideias. Custa-me ver a alegria ser tão pouco: pequena onda logo submergida por
outra maior, negra, confusa, deprimente. Que diabo se passará connosco que não
sabemos criar espaços solares que durem a vida de cada um, transmissíveis e,
entretanto, melhorados, de modo a premiarmos honradamente, aqueles que a seguir
chegarem.
É um facto que o futuro é rumar-se para caminhos de
incerteza; mas esse rumo poderia ser severamente atenuado se a mão humana se
entregasse à provisão de fórmulas dignas, estas, por sua vez, certamente
libertadoras de um caprichoso primarismo onde se patinha.
Fala-se que a epidemia que no momento nos ameaça e confina
terá tido origem intencional ou negligente. Não sabemos se terá sido assim, o
fogo cruzado de acusações trás consigo outros objetivos, não nos dá sumo para
nada. Porém, é sabido, (e não nos fica bem sermos ingénuos nestas avaliações)
que, por todo o lado, interesses ligados àquilo a que se chama defesa, ou
segurança, investem, tanto em inteligência quanto em capitais, valores
ocultados na manipulação de viros e bactérias visando a criação de armas de
letalidade diabólica, cuja confirmação de eficácia, necessita ser comprovada no
terreno.
Outra coisa, mas esta demasiadamente comprovada, é a de que a
maldade humana não tem limites, e que nem a chegada dos adventos mais
promissores que a história informa, fora capaz de debelar.
A vida não é má. A natureza não é má. Nada do que existe no
universo se move com o propósito de nos castigar. A chuva é boa. O sol é bom.
Até a dor, quase sempre quando aparece, é para nos avisar de possíveis erros de
caminho.
O problema, talvez sejam os conceitos que geramos e nos
servem de guia: o conceito de herói, o conceito de grandeza, o conceito de bem-
fazer, os tantos conceitos que nos aglutinam e dogmatizam, eles mesmos tão
visíveis, que a não tangibilidade dos mesmos devia carregar-nos de
preocupações. Desculpem o desabafo, mas estou zangado de me roubarem à vida
que, sem convívio, carece de sentido.
6 de Maio de 2020
João Santiago
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