quinta-feira, 7 de maio de 2020

NO DIA MUNDIAL DA LÍNGUA PORTUGUESA


Caríssimas e caríssimos companheiros da UNISETI,
Então, têm lido muito, têm escrito alguma(s) coisa(s)? Já li de alguns, textos muito interessantes no blog que o Dr. Arlindo Mota coordena. Parabéns!
Começo por agradecer as mensagens escritas, as lindas imagens e os telefonemas que tenho recebido. É sempre um prazer falar com quem tem os mesmos interesses que nós e sobretudo com alguém que conhecemos e que estimamos. Bem hajam! Falar convosco ou ler-vos é um bálsamo para este viver entre quatro paredes em que tenho de continuar pelo menos por mais um mês.
Hoje celebra-se em todo o universo lusófono do Dia Mundial da Língua Portuguesa e, sendo terça-feira, o nosso dia, não poderia deixar de aparecer aqui. Só para um breve apontamento. Comemorando-se desde 2009, só em 2019 o Dia Mundial da Língua Portuguesa foi reconhecido e ratificado pela UNESCO. É mais uma data a lembrar que, de entre vários fatores e símbolos, também a língua nos une enquanto comunidade. Na opinião de alguns, é um ponto de ligação dos mais fortes, tocando as fibras mais sensíveis do nosso eu.
Socorrendo-me das palavras do tradutor da versão portuguesa de a Demanda do Santo Graal, «‘mas ora leixa falar’ os textos», em vez de falar sobre o assunto, vou trazer para aqui alguns escritores que de forma bela, metafórica e determinante têm valorizado esta simbologia da língua portuguesa e das palavras que a constituem, promovendo a sua afirmação e, portanto, a sua importância para a nossa identidade, que tem feição global, já que a língua portuguesa é falada em todos os continentes, refletindo um aspeto identitário dos povos que a falam, que é indissociável do mar, que simultaneamente nos separa e liga.
Diz Fernando Pessoa: “Não tenho sentimento nenhum político ou social. Tenho, porém, num sentido, um alto sentimento patriótico. Minha pátria é a língua portuguesa. Nada me pesaria que invadissem ou tomassem Portugal, desde que não me incomodassem pessoalmente. Mas odeio, com ódio verdadeiro, com o único ódio que sinto, não quem escreve mal português, não quem não sabe sintaxe, não quem escreve em ortografia simplificada, mas a página mal escrita.”  [Livro(s) do Desassossego. Ed. Teresa Rita Lopes] Todos nós conhecemos esta citação, mas no seu contexto frásico (que raramente é referido) conseguimos percebê-la melhor.
Vergílio Ferreira, em 1991, acrescenta-lhe outra ideia: «Da minha língua vê-se o mar» [“A Voz do Mar”, in Espaço do Invisível 5], reforçando a simbologia desta identidade. José Afonso, refletindo poeticamente sobre a questão, “sou de uma vaga pátria carinhosa”, reconhece que “as palavras entontecem / quando dispersas levantam rumos vários” (Textos e Canções). Eugénio de Andrade, reforçando os sentimentos de afetividade incluídos no sentido de pertença a uma língua, afirma “Com palavras amo.” [Cristalizações].
Mia Couto conta-nos  a história da mana Poeirinha “que foi beijada pelo mar. E se afogou numa palavrinha.” [O Beijo da Palavrinha] E assim esta simbologia identitária transforma-se. A palavra mar, ao beijar-nos (quando a proferimos) toma conta de nós, leva-nos consigo. Na perspetiva que estamos a privilegiar, nós, falantes da língua portuguesa, passamos a ser parte dessa simbologia.
Podia ficar aqui citando autor após autor, já que praticamente todos têm escrito textos sobre a importância das palavras e da língua portuguesa, mas esta conversa já vai longa. Vou deixar-vos o prazer dessa descoberta nos livros que há aí por casa. Vão aos livros. Deixem a internet a descansar. É mais demorado, mas muito mais prazeroso. Enquanto se faz uma pesquisa em livro as coisas fantásticas que encontramos! Bilhetinhos antigos, frases sublinhadas que já tínhamos esquecido e muito mais…
Para acabar, vou deixar-vos com uma estrofe de Resendes Ventura, o poeta que foi meu companheiro por 41 anos, sem mais comentários.
Beijinhos,
Fátima Ribeiro de Medeiros

“Logo Existo” II
I
Como as palavras são a minha essência
sem mais filosofia que mo negue
procuro no sentido do meu ser
as palavras, palavras, as palavras.

As Palavras que eu Sou (livro inédito)





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