Mal chegou aquele lugar, situado lá para os cabos do absurdo,
e então era de ver como o próprio surpreendente acorria a tropeçar nele.
Reparou
facilmente que a quase totalidade dos moradores olhava o
mover do mundo à sua volta, mas olhava para não ver. Reparou que havia escolas
onde aos habitantes se ensinava essa estranha pratica de olhar para não ver,
usando-se, ainda, um processo de indução que os levava a convencerem-se que,
mesmo olhando, diziam não ver o que estavam vendo. Reparou que o próprio lugar
era uma máquina que, tendo embora muitos olhos, olhava, não em função do ver
nítido, mas em função do não ver nítido. Reparou, também, que isso era gerador
de grande confusão e de maior sofrimento e que se devia à sacralização de um
embuste social a que chamavam economia.
E, então, deu-se a interrogar. Como é que tanto investimento
na cegueira prepara alguma coisa ou alguém para devires trágicos que, como elos
de corrente, estão sempre a chegar? Com o acréscimo de que, o discernimento
trazido pelo olhar de ver, informaria o todo que, podem não ser sempre as
tragédias que se abatam sobre os lugares, mas serem os erros de caminho a
levarem os lugares à tragédia.
Claro que toda a vida
é um lugar rodeado de perigos. Mas um enxame de vespas será tão perigoso quanto
nos afastarmos dele ou nos atrevamos a tentativas de aniquilação. Havia depois
ali uma grande confusão que instalava todos os absurdos: nunca souberam
discernir a diferença abissal que havia entre o quererem viver, e o darem cabo
da vida, tarefa a que se dedicavam com bastante zelo.
João Santiago
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