Episódio
9
Embora com maior
permanência em casa, não aumentei o tempo dedicado à televisão, sendo os
noticiários o que normalmente vejo.
Compreendo e
aceito que o tema do Corvid-19, pela sua magnitude aterradora seja o assunto
principal de todos os noticiários, mas a ocupação do tempo é tão grande que
parece já não haver guerras por esse mundo fora, nem deslocações de populações
em massa, nem campos de refugiados; já nem se fala disso.
Depois, com a
frieza que só os números têm, apresentam-nos diariamente as quantidades de
mortos, infectados, internados e curados. E veem as avalanches de gráficos, a
cores ou a preto e branco, de barras, circulares, de linhas e os histogramas,
para voltar a dizer o mesmo. E vêm os picos, a deslocação dos picos, os
achatamentos, os planaltos. Sempre o mesmo.
Mas há dois dias
caiu a pedra no charco: o ex-Presidente da República Ramalho Eanes foi
entrevistado pela jornalista Fátima Campos Ferreira. Na parte final da
entrevista o General, emocionado, disse do alto dos seus 85 anos, que os velhos
são pessoas como as outras, que podem ser exemplo e que se estivesse no
hospital com o vírus e necessitasse de ventilador, o cederia a alguém jovem com
mulher e filhos que necessitasse daquele dispositivo para se salvar. Foi o
coração português a falar.
Vem a propósito
citar o professor Agostinho da Silva que na sua última entrevista referiu que
os italianos àquele órgão vital chamam cuore e os franceses coeur, mas os
portugueses deram-lhe mais importância: introduziram-lhe um aumentativo e deu
coração, que é uma coisa grande. Tal como a vontade do povo a que pertence,
acrescento eu.
3
de Abril de 2020.
Sanchez Antunes
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