sábado, 25 de abril de 2020

REGISTOS DE UMA QUARENTENA, OU MAIS.



Episódio 13

De vez em quando pego no smartphone, percorro a lista dos contactos e ligo àqueles de quem há mais tempo não tenho notícias.
Hoje calhou a vez de estar à conversa, com um amigo de longa data, um homem simples e bom que vive no campo. O local não é um descampado, mas as casas dos vizinhos distam pelo menos uns bons cem metros umas das outras e a separá-las vinhas e mais vinhas.
Está claro que a conversa começou (e acabou) com o tema do dia e, embora a “coisa” vá sendo suportável sempre fui dizendo que saídas de casa só para ir à farmácia e pouco mais.
A resposta deixou-me a pensar:
- Pois aí está uma grande diferença entre o campo e a cidade. Vocês, aí na cidade saem de casa para ir à farmácia, eu saio de casa para ir à horta, tratar dela, colher o que preciso para a panela e de regresso passo pela capoeira e trago os ovos que as galinhas puseram. Tudo como a natureza o dá.
- Realmente, nesse aspecto tens razão, respondi. Mas os seres humanos são gregários, vivem em grupo, concentram-se nas cidades.
- Sim, vivem em prédios de muitos andares, em cima uns dos outros e apesar disso já ouvi dizer que há casos em que no mesmo prédio vivem pessoas que não se conhecem e nem se cumprimentam quando se cruzam na escada ou utilizam o mesmo elevador. Quando vou ver a vinha ou as árvores e vejo um dos meus vizinhos, lá no terreno dele, levanto o braço em sinal de cumprimento e ele responde-me da mesma maneira. Depois há outro aspecto que te quero lembrar: é a perda de contacto com a Natureza que os citadinos têm. Não sabem o que é sentir a terra lavrada destorroar-se debaixo dos pés, sentir o cheiro que sobe da terra aquando das primeiras chuvas, sentir a força pujante da Natureza em toda esta verdura viva que me rodeia.
- Parece-me que hoje estás com a veia poética desatada, atalhei eu.
- Talvez sim, já li em qualquer lado que a poesia faz parte da vida.
- Certamente que sim. Mas diz-me lá, o que é que pensas desta pandemia do corona?
- O que eu penso é que é a Natureza a cobrar a factura das agressões a que os seres vivos humanizados (alguns muito pouco) a tem sujeitado. Isto tinha que acontecer, com vírus, criados nos laboratórios dos humanos ou no grande laboratório da Natureza ou com outra catástrofe qualquer, era inevitável e espero que o pior não esteja para acontecer, pois como também já li não sei onde, “a Natureza destruirá o homem antes que o homem destrua a Natureza”.
- Palavras muito acertadas meu amigo, estou contigo na defesa desta Grande Casa Humana.
  
22 de Abril de 2020
Sanchez Antunes

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